17.4.07

Uma Camera Obscura para Formigas

A câmara fotográfica apareceu antes da fotografia e chamava-se camera obscura. Os seus princípios de funcionamento já eram entendidos no tempo de Aristóteles, mas foi a partir do século XVI, quando no pequeno buraco das cameras obscuras originais foi colocada uma lente convexa, que o aparelho se transformou num meio para o registo permanente de imagens. Vermeer e Canaletto são apenas dois exemplos de artistas que utilizaram a camera para a criação de algumas das suas obras. Quando Johann Heinrich Schulze (1687-1744) ainda fazia fotogramas com letras recortadas e coladas em garrafas cheias com cloreto de prata e ácido nítrico, quando a daguerreotipia ainda era um sonho de Niépce (1765-1833), já o apparatus estava mais do que preparado para receber a nova invenção. Mas era para “desenhar por cima” que a camera obscura servia antes da invenção da fotografia (na verdade também foi útil na astronomia, muito antes de Vermeer a utilizar). Vamos agora ver os resultados de um artefacto vagamente semelhante, mas artificial, e concebido para formigas artificiais. Uma camera digital onde as formigas podem desenhar, com feromona, por cima de imagens a preto-e-branco.

Carlos Miguel Fernandes, Shigisoara, Roménia, 2004

Carlos M. Fernandes+Vitorino Ramos, Self-Regulated Swarm Image #1

Carlos Miguel Fernandes, Timisoara, Roménia, 2004

Carlos M. Fernandes+Vitorino Ramos, Self-regulated Swarm#2


Quem estiver interessado na parte científica do projecto, pode consultar os seguintes artigos:

Carlos Fernandes, Vitorino Ramos and Agostinho C. Rosa, Self-Regulated Artificial Ant Colonies on Digital Image Habitats, in Int. Journal of Lateral Computing, IJLC, vol. 2, nº 1, pp. 1-8, ISSN 0973-208X, Dec. 2005.

Vitorino Ramos, Filipe Almeida, Artificial Ant Colonies in Digital Image Habitats - A Mass Behaviour Effect Study on Pattern Recognition, Proceedings of ANTS´2000 - 2nd International Workshop on Ant Algorithms (From Ant Colonies to Artificial Ants), Marco Dorigo, Martin Middendorf & Thomas Stüzle (Eds.), pp. 113-116, Brussels, Belgium, 7-9 Sep. 2000.

Posso adiantar que as formigas em causa têm apenas percepção local, “vêm” só, em determinado instante, o pixel onde estão colocadas e os pixels circundantes. Não há controlo centralizado do enxame. A imagem emerge através da interacção do formigueiro com o ambiente.

Carlos Miguel Fernandes

16.4.07

Associação Portuguesa de Photographia

Foi criada no dia 13 de Abril a Associação Portuguesa de Photographi@. Cem anos depois de ter sido fundada a sua antecessora, a Sociedade Portuguesa de Photographia.
No Cartório Nacional de Georgina Martins, em Lisboa, assinaram a escritura de fundação e legalização os seguintes doze sócios fundadores: Alexandre Ramires, Ângela Camila, António Barreto, António Faria, António Pedro Vicente, Carlos Miguel Fernandes, João Clode, João Loureiro, José Pessoa, Madalena Lello Colaço, Sérgio Gomes e Vitória Mesquita. A associação conta já com várias dezenas de futuros sócios fundadores.

Sem propósitos de especulação comercial nem fins lucrativos, a APPh tem como objectivos o estudo histórico e o progresso científico e artístico da fotografia nas suas implicações técnicas, históricas e sociológicas e aplicações científicas e artísticas, designadamente a investigação sociológica e histórica da imagem fotográfica; a memória fotográfica e a sua preservação; a aplicação de métodos de inventariação e catalogação; a investigação estética e artística inclusivamente na fotografia moderna. A Associação procurará dignificar o património fotográfico nacional, e estimular a organização de uma biblioteca e de um centro de documentação. Assim como se esforçará por organizar exposições, cursos, conferências e colóquios. A APPh pretende ainda contribuir para o fomento do ensino da fotografia em todos os níveis e graus de ensino.

A APPh. criará também, logo que possa, uma página na net (website)
http://www.apphotographia.com/ com o fim específico de servir de ligação e de informação sobre as actividades da associação.

Podem contactar-nos através do E-mail
apphotographi@gmail.com

Lisboa, 15 de Abril de 2007


(Comunicado de imprensa da Associação Portuguesa de Photographia.)

Carlos Miguel Fernandes

11.4.07

Flaubert e a Daguerreotipia

Afinal, Carlos, depois de fechar a porta, pediu-lhe que fosse pessoalmente a Ruão a fim de saber quais poderiam ser os preços de um bom daguerreótipo; era uma surpresa sentimental que reservava à sua mulher, uma atenção fina, o seu retrato, de casaca. Mas queria primeiro saber, para fazer os cálculos; essas passadas não deviam custar muito a Leão, porque era rara a semana que não ia à cidade.

Gustave Flaubert, Madame Bovary

O daguerreótipo foi a primeira forma popular de fotografia. O termo pode designar o resultado final ou o processo, o qual se caracterizava por produzir provas únicas de elevada qualidade. A sua invenção foi comunicada ao mundo no dia 6 de Janeiro de 1939 (19 de Agosto foi a data oficial do anúncio e da divulgação dos pormenores do processo) pela Academia de Ciências francesa. O invento (e a sua designação) ficarão para sempre associados ao nome de Louis-Jacques Mandé Daguerre (1787-1851), mas a injustiça é evidente se nos lembrarmos que foi Joseph Nicéphore Niépce (1765-1833) quem desenvolveu as bases teóricas, técnicas e científicas do processo.



Enquanto a Fotografia que nos habituámos a conhecer até à chegada da era digital se baseava no princípio do negativo-positivo e nas inúmeras reproduções que podiam ser feitas a partir uma imagem, o daguerreótipo resultava num exemplar único em positivo com uma óptima definição de pormenores. E se este apuro lhe garantiu uma popularidade inabalável durante os anos quarenta do século XIX, relegando o negativo-positivo para uma evolução paralela com poucos adeptos entre os profissionais, o carácter único das provas acabou por ser umas das causas do seu declínio quando o processo concorrente se aperfeiçoou até chegar a um nível que satisfez os fotógrafos. Estes, maioritariamente envolvidos no negócio do retrato e bem servidos pelo daguerreótipo, não estavam interessados nas imperfeições e nos longos tempos de exposição inerentes aos primeiros passos do processo alternativo e exigiam mais.

O pioneiro do método fotográfico baseado no princípio negativo-positivo foi o inglês William Henry Fox Talbot (1800-1877). A técnica que Talbot desenvolveu envolvia imagens em negativo e reproduções em positivo, ambas sobre papel, mas a fraca definição das provas finais e a impossibilidade de utilização livre do método (Talbot patenteara a sua invenção e exigia o pagamento de direitos de autor a quem utilizasse comercialmente o seu método fotográfico) mantiveram a calotipia, também conhecida por talbotipia, e outras técnicas herdeiras do processo longe da preferência dos fotógrafos profissionais durante mais de uma década. No entanto, o seu paradigma acabaria por vingar, dominando grande parte da História da Fotografia; a daguerreotipia como método preferido pelos fotógrafos profissionais acabaria por ser substituída durante os anos cinquenta do século XIX pelos negativos de colódio húmido em vidro e provas de albumina. Foi Frederich Scott Archer (1813-1857) quem deu o derradeiro impulso na queda da daguerreotipia, ao usar colódio húmido em vez da habitual albumina na ligação dos sais de prata ao vidro, aumentado a qualidade das reproduções e diminuindo as dificuldades técnicas. No entanto, a albumina continuou a ser usada no papel para as provas em positivo durante mais algumas décadas, até ser substituída pelo papel de fabrico industrial nos anos oitenta do século XIX.

Hippolyte Bayard, Autoportrait en noyé, 1840

Um resumo dos primórdios da História da Fotografia não pode estar completo sem o nome de Hippolyte Bayard (1801-1887). Bayard, o mais ignorado dos quatro inventores da Fotografia, foi também esquecido pela Academia das Ciências francesa que, em 1839, e protegendo Daguerre, só lhe atribuiu uma bolsa de 600 francos pelas suas descobertas (Daguerre e Isidore Niépce, filho de Joseph Niépce, conseguiram rendas vitalícias de 6000 e 4000, respectivamente). Ficou para História da Fotografia o auto-retrato apócrifo de Bayard, onde este escreveu: Le gouvernement qui avait beaucoup trop donné à M. Daguerre a dit ne rien pouvoir faire pour M. Bayard et le malheureux s'est noyé. (O governo, que deu demasiado ao senhor Daguerre, disse nada poder fazer em favor do senhor Bayard e o infeliz afogou-se.)

Carlos Miguel Fernandes

5.4.07

Os Alfarrabistas de Amsterdão II

Vamos olhar agora com mais atenção para os livros que vieram de Amsterdão.










Photographies de Henri Cartier-Bresson foi editado em 1963 pela Delpire e reproduz os textos que fizeram o celebrado prefácio de Images à la Sauvette (The Decisive Moment, título da edição inglesa). O livro começa com a famosa frase: Une photographie est pour moi la reconnaissance simultanée, en une fraction de seconde, d'une part de la signification d'un fait, et de l'autre, d'une organisation rigoureuse des formes perçues visuellement qui expriment ce fait. Seguem-se os textos, e quarenta e sete fotografias que percorrem a obra de Henri Cartier-Bresson (1908-2004) desde 1932 até 1961, ano em que o fotógrafo captou uma das suas mais prodigiosas imagens, o retrato do escultor Alberto Giacometti (1901-1966). Capa dura e boas impressões num papel razoável fazem de Photographies de Henri Cartier-Bresson um estimável objecto de colecção.



Henri Cartier-Bresson, Alberto Giacometti, 1961



A primeira grande retrospectiva do trabalho de Jacques Henri-Lartigue (1894-1986) em terras francesas ficou registada no pequeno catálogo 8x80, com edição da Delpire e prefácio de Michel Frizot. Patente ao público em 1975 no Musée des Arts Decoratifs, em Paris, a exposição contou com cerca de duzentas fotografias, das quais foram seleccionadas sessenta e uma para integrar o catálogo. O papel é óptimo e as provas estão perto da perfeição.


Lewis Carroll (1832-1898) é famoso como autor dos livros Alice no País das Maravilhas e Alice do Outro Lado do Espelho. Menos conhecida é sua actividade como professor de matemática, mas uma leitura cuidada dos textos revela uma ligação à lógica, à ciência, ao xadrez; e ainda hoje os dois livros são terreno fértil de metáforas para paradigmas e teorias. (O termo Red Queen Effect, que designa uma teoria da biologia evolutiva cada vez mais contestada que pretende explicar alguns fenómenos como a emergência e vantagem do sexo no processo de evolução, foi inspirado num episódio do livro Alice do Outro Lado do Espelho.) A sua obra fotográfica, centrada no retrato, encontra-se também na sombra do sucesso dos livros de Alice, mas tem argumentos para nos pedir um olhar atento. A afinidade com o trabalho de Julia Margaret Cameron (1815-1879) é notória, não só nas formas como no método: Lewis Carroll, tal como a fotógrafa inglesa, encontrava naqueles que lhe estavam próximo os motivos dos seus estudos fotográficos. As crianças ocupam grande parte do seu trabalho, e Alice Liddel, a Alice que inspirou os seus livros, faz parte da extensa galeria de retratados (que inclui também Julia Margaret Cameron). Lewis Carroll, Photographer começa com um texto de Helmut Gernsheim sobre o autor integrando-o na História da Fotografia inglesa. Seguem-se sessenta e três retratos, onde não falta Alice Liddel, nem o xadrez, uma das paixões de Carroll: o notável The Misses Lutwidge, 1859, mostra as tias do fotógrafo no “meio jogo” de uma partida de xadrez. Este livro agora adquirido em Amsterdão junta-se a uma das peças mais estimadas da biblioteca, a qual encontrei em Lubliana há alguns anos. Chama-se Lewis Carroll, foi editado pelo British Council em 1998, no centenário da morte do artista, e junta ensaios de Marina Werner, Roger Taylor e Michael Bakewell, para além de vinte e quatro imagens.


No livro Stielglitz – a memoir/biography, de Sue Davidson Lowe, podemos encontrar, para além da biografia do grande fotógrafo e galerista americano Alfred Stieglitz (1864-1946), alguns retratos por ele executados, nos quais se incluem dois auto-retratos e uma inevitável fotografia da pintora Gergia O’Keefe (1887-1986), a mulher com quem esteve casado durante mais de duas décadas, até à sua morte em 1946.

Kindred Spirits, Hungarian Photographers 1914-2003 é o catálogo de uma exposição sobre fotografia húngara comissariada por Péter Nadas (1942-) que esteve em exibição no Museu de Fotografia de Hague entre Setembro de 2004 e Janeiro de 2005. Budapeste é uma cidade que tenho visitado com regularidade nos últimos anos e de onde tenho trazido algumas referências que vou guardando na prateleira. No entanto, é fácil esquecer que a Hungria já nos deu fotógrafos como Robert Capa (1913-1954), Brassai (1899-1984), Kertész (1894-1985) e Moholy-Nagy (1895-1946), pois tais nomes foram internacionalizadas e fazem agora parte do património da humanidade. O livro guarda excelentes reproduções de alguns trabalhos dos autores citados, e de outros, como Márta Rédner (1909-1991), Martin Munkasci (1896-1963), e até Péter Nádas, o comissário da exposição e autor dos textos que acompanham as fotografias. Talvez os ensaios de Nádas me ajudem a reunir e a entender o material que tenho trazido de Budapeste.


Carlos Miguel Fernandes

3.4.07

Patagónia

Inaugura hoje, dia 3 de Abril pelas 18.30, a exposição de fotografia Torres del Paine - Patagónia 990208 07.38 am - 8.03 pm, de José Soudo. É na Casa da América Latina e estará patente ao público até ao dia 24 de Abril. (Informação obtida no Grand Monde.)

NAF